quarta-feira, 22 de maio de 2013

Demissão de 11 mil servidores….

BRIGA Moises e juiz_blog

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que obriga o governo do Acre demitir 11,5 mil servidores contratados sem concurso público, até 31 de dezembro de 1994, está em discussão no Estado. Falta apenas o STF modular os efeitos da decisão, para vigorar a partir de 12 meses contados da data da publicação da ata de julgamento, o que possibilitará ao governo estadual tempo para preencher com servidores concursados os quadros que à época estavam em extinção.

Nos anos de 1985/1986, quando eu tinha por volta de 16 anos e trabalhava com informática na antiga Casa Yunes, em Rio Branco, fui chamada, juntamente com outros colegas, para ir à Secretaria de Administração assinar um contrato de trabalho. O convite para trabalhar, na época da política, era na base do "boca a boca".

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Cheguei numa sala e perguntei onde estavam contratando. Na mesa, diversas folhas de contratos em branco, mas já assinados pelo então secretário, numa sala do térreo do Palácio das Secretarias. Uma pessoa preenchia a folha e nos encaminhava para tirar Pasep, e outros documentos. Saí da Casa Yunes e passei quase dois anos no setor de folha de pagamento, datilografando fichas mensais pessoais.

Em menos de dois anos, participei de uma seleção do Sesc, e fui contratada para o setor de matrículas dos comerciários, passando depois para a assessoria técnica, com o então superintendente Luis Celso Ferreira Santos. Logo a seguir, veio a nova Carta Constitucional, determinando as contratações mediante concurso público, a partir de 1988.

O que posso dizer, do pouco que me recordo daquela época, é do total amadorismo na gestão pública, sendo tais contratações um mero exemplo do que ocorria. Nem todas as pessoas efetivamente prestavam serviço nos seus locais de trabalho. Muitos contratados nem apareciam. Outros iam apenas assinar a folha de ponto e voltavam para casa. Não havia muito acompanhamento de chefias, nada. Lembro que algumas pessoas nem moravam no Estado. Eu mesma não cheguei a conhecer todos os colegas de setor, cujas fichas pessoais datilografava durante as tardes, na minha breve passagem no Estado.

Depois de tanto tempo, não há mais como separar e identificar quem realmente trabalhava e quem eram os fantasmas, enriquecendo-se ilicitamente às custas do Estado. Isto seria necessário para que houvesse alguma justiça real nessas demissões e nas eventuais indenizações que sobrevenham aos servidores, pois alguns ressarcimentos deveriam ser em favor do Estado, a bem da verdade.

Trata-se de um momento crítico, para o qual o Poder Judiciário não contribuiu, e por isto, não pode ser visto como bode expiatório, no lugar dos reais responsáveis.

Se foi eventual erro de técnica legislativa que chancelou tais contratos, só pode ser corrigido por igual caminho ou pela via judicial, e pela realização de concurso, que valorize a meritocracia exigida por uma verdadeira gestão de excelência no serviço público.

Paciência. Não estou desmerecendo quem trabalhou efetivamente. Entre os 11 mil servidores (e alguns fantasmas) e a relevância do interesse público de mais de 700 mil cidadãos acreanos, que seja feito o desligamento com as respectivas e justas indenizações e se recomece pelas vias corretas. Melhor indenizar essas pessoas do que arcar com pagamento de multas milionárias à Justiça. E a administração sempre pode rever seus atos para melhor. Esse é o caminho de eficiência que cidadãos esperam, para não verter recursos para um ralo de enriquecimento indevido.

Por outro prisma, é certo que, para efeito da fase de transição, inúmeros cargos e funções restaram mantidos após a Constituição Federal, nos chamados "quadros em extinção" e este é um dos aspectos que devem ter sido considerados na situação, mas dentro das hipóteses cabíveis, sem alcances indevidos. É por isto que a modulação é extremamente necessária neste caso, para não gerar maiores danos na organização estatal.

Esse processo tem sido longo, mas após o trânsito em julgado da decisão final, deverá ser cumprido. Num sistema de freios e contrapesos entre os Poderes, o Judiciário existe para garantir o funcionamento legítimo das instituições dentro do Estado de Direito - o Estado obediente às suas próprias leis. Ou seja, evitando benefícios indevidos e ilegalidades.

Nem se considerem os mencionados "gracejos" com a suposta inexistência de concurso público no Acre, pois isto não é verdade. A memória me permite testemunhar do aperfeiçoamento contínuo da gestão pública acreana.

Mas, no caso em questão, como em outros mais amplamente divulgados, e em qualquer outro, o Judiciário jamais chancelará irregularidades na gestão pública. Tudo é muito bem visto e analisado, com acautelada revisão em diversos graus de jurisdição, que, neste caso, vem durando mais de dez anos.

Essa é uma garantia constitucional de todos os cidadãos e contribuintes. Manifesto-me como cidadã. Se eu não tivesse saído para o Sesc, estaria nessa situação, e caso fosse demitida, buscaria discutir eventual indenização. Portanto, calma. Saídas existem, basta procura-las, com boa intenção.

Mirla Regina é juíza de direito da Vara de Execuções Fiscais de Rio Branco

DEBATE - atualização

Destaque para o comentário de Giordane Dourado

- Manifestando-me agora como juiz e membro do movimento associativo (ASMAC), entendo que a decisão do STF lastreou-se em parâmetros constitucionais sólidos, os quais, ao fundamentarem a exigência de concurso para o provimento de cargo no serviço público, prestigiam a moralidade e a impessoalidade administrativas, bem como o mérito de quem estuda com sacrifício, às vezes em detrimento de sadias noites de sono, para lograr justa aprovação em certame público. Atacar gratuitamente o STF e propor desobediência civil contra a decisão da Suprema Corte reflete o mais medíocre e oportunista pensamento populista que contamina como vírus letal as instituições latino-americanas. Sou magistrado porque estudei, sofri, chorei e superei as dificuldades de um concurso dificílimo. E tenho muito orgulho disso. Para aqueles que infelizmente serão afastados da administração pelo erro grosseiro de maus administradores, caberá a justa indenização, mas não a permanência no cargo em manifesta ofensa à Constituição da República.

Destaque para o comentário do deputado Moisés Diniz (PCdoB)

- Medíocre, oportunista e populista talvez seja a posição de quem ganha milhares de reais e defende a demissão de 11 mil pais e mães de família, que só têm esse salário para alimentar os seus filhos e comprar os remédios para as suas doenças. Eu jamais chamaria um juiz de direito de medíocre, oportunista e populista. A Assembleia Legislativa vai fazer uma reclamação formal à Associação dos Magistrados e ao Tribunal de Justiça pelas ofensas aqui publicadas. De nossa parte, vamos continuar respeitando as pessoas e criticando, se necessário, os atos das instituições.

Tréplica do juiz Giordane Dourado:

- Prezado deputado, como estudante do Direito Constitucional e mestrando nessa matéria na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, não defendo a demissão nem o estado de miséria de ninguém, mas, sim, o respeito à Constituição da República e às decisões do STF. É essa mesma Constituição, por exemplo, que resguarda a Vossa Excelência imunidade parlamentar para expressar suas opiniões, por isso acredito quebo senhor também tem interesse em defendê-la. Com relação ao termo "medíocre", se o senhor prestar atenção ao que escrevi, perceberá que fiz referência a mediocridade de pensamento, não da pessoa e do cargo. Mas fique à vontade para fazer sua reclamação, aproveitando a oportunidade para explicar nela como esse movimento de desobediência civil pretende invadir o prédio do Tribunal de Justiça, conforme foi noticiado na imprensa. Por fim, com relação ao valor do meu subsídio, esclareço que ganho apenas ele por mês para sustentar-me, sem quaisquer outras verbas, como, por exemplo, verba indenizatória, cotas de telefone, passagens aéreas ou de combustível. Quem quer debater no campo da inteligência e dos argumentos não precisa recorrer a ameaças ou intimidações.


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